segunda-feira, 14 de julho de 2008

suicídio duplamente qualificado.

Elas olharam-se, viram-se uma na outra, gostaram do que viram, e decidiram que seriam amigas.
Ela nutria uma paixão eufórica por ela, tão eufórica quanto ela mesma. Saíam juntas, estudavam juntas, dormiam juntas... Tinham os mesmos gostos, o mesmo estilo, o mesmo pensamento nas mesmas horas. Passaram a confundir-se em suas vidas como se não soubessem onde começa e termina a outra. Achavam isso bom, era uma prova de tamanha amizade.
Até que ela começou a sentir a presença de um corpo estranho, mas que quando olhava, via a si própria. Isso atormentava sua mente e ela passou a sentir um ódio profundo daquela que ela via todos os dias presente na sua vida, dona da sua vida. Era invasivo o seu corpo. Tudo o que a mesma fazia, parecia uma cópia defeituosa sua, que ninguém era capaz de perceber as nítidas diferenças.
Tudo irritava naquela relação viciosa da qual ela não conseguia escapar. E se os efeitos das qualidades comuns a ambas, foram tão explosivos, os efeitos dos defeitos seriam catastróficos. Qualquer coisinha que antes não passava de uma pequena mania, um aspecto qualquer que poderiam apontar como uma "rasura" no seu "eu definitivo", se transformava num imenso borrão à tinta, cada vez mais intenso. E ela já não sabia quem era, se o definitivo perfeito, ou se o imenso borrão. E isso tirava-lhes o sono, o sonho, o som. Restou o ruído, o pesadelo e a olheira. E a preocupação da outra diante da situação, aumentava ainda mais sua irritação. Ela virou um monstro, cuja a presa era ela mesma.
O desespero só aumentava, e numa noite de insônia em que dormiriam juntas, ela cometeu a asneira de cair no sono.
Era a única saída, ela tinha de quebrar o espelho.

2 comentários:

Lúcia Neco disse...

É gritante como minhas palavras parecem proféticas.
"As semelhanças assustam mais que as diferenças."

E assi vou vivendo assustada.

thiê disse...

impressionante... extraordináriamente impressionante. Afinal, a imagem-semelhança e o narcisismo em projeção de imagem sempre me fizeram muito pensar. com certeza voltarei aqui pelos outros que vierem. Até lá...